Quem segue este blog há algum tempo é capaz de já ter percebido que eu adoro poesia. O que muitos não sabem é que tenho um livro de poesia publicado. Embora seja uma coisa já antiga, hoje resolvi trazer alguns dos poemas que escrevi ao longo do tempo (e que fazem parte desse livro) aqui para o blog. Espero que gostem!
Voz
É voz de sal e luz ao luar
Que encanta meu mal, que seduz meu amar
E nós que ouvimos tal cantar
Mais puro que ouro que reluz ao brilhar
Estando sós como ele conseguimos lembrar
A esperança que vem de qualquer sonhar
É sonho o que traz na voz
Como quem tem uma saudade atroz
Do ser com quem aprendeu a pensar
Que o amor também pode ter um final a rimar
É voz que embala e consola a dor
De quem, como nós, já não crê no amor
E a quem agora só resta ouvir a canção
Que embala e consola o coração
No futuro também a voz será esperança
E a dor já não passará de uma lembrança

O tempo que nos resta
O tempo que nos resta é já pouco
Amor, que não queres crer
Que o tempo que nos resta seja amigo
De quem já não sabe o que fazer
Se o tempo quisesse guardar
Em si, o tempo do nosso amor
Talvez assim o tempo do nosso amar
Fosse mais do que simples dor
Mas o tempo não quis ajudar
Quem não teve tempo de crer
Que o amor está sempre a lutar
E a tudo consegue vencer
E mesmo que num qualquer dia destes
O tempo apague o nosso amor da história
Nem o tempo fará desaparecer
De nós, uma tamanha memória

Saudade
Saudade é nome de mulher
Furacão em noite sem lua
Saudade é dor de crescer
Joelhos rasgados no meio da rua
Saudade é esperança perdida
Naquilo que já passou
Saudade é tristeza esquecida
Pelo que já se amou
Saudades são erros passados
Antigos pecados
De quem nunca vi
Saudades são sonhos rasgados
Olhos molhados
Da distância de ti
Saudades são dores sozinhas
Esperanças vizinhas
De sonhos não meus
Saudades são pequenas linhas
Das mãos que são minhas
Dos olhos que são teus
Passo a passo
Passa que passa
Passa e dá
Um passo e mais outro
Passo para lá
Finge que anda
Anda e finge
Não fingir que manda
Não fingir que nos atinge
É passo fingido
Inimigo incerto
Que passa e passa
Cada vez mais perto
E passo a passo
Passa e está
Cada vez mais longe
Do lado de lá
E passa e passa
A passo e passo
Cada passo que traça
Está mais fora do compasso
Passo a passo
Decidido e sonolento
A passo rápido
A passo lento
Passa a passo
E passo a passo
Passa com passo
De passar a passo
E a passo e passo
Passa e traz
De longe a saudade
De ser capaz
E já sem poder
Passar para lá
Passa a passo
O lado de cá
Canção
Na tua canção
Há o amanhecer de um novo dia
O azul do céu, a harmonia
Que alegra e entristece o coração
Na tua canção
Há a lembrança da glória
A esperança negra, a vitória
Do sim sobre o não
Na tua canção
Há a melodia da ave
O rio que corre, suave
E o riso de uma criança
Na tua canção
Há a voz de um anjo sagrado
Anjo negro tresmalhado
Que perdeu a salvação
Na tua canção
Há o soprar de um vento de leste
A calma lenta e agreste
Os sons de terras meridionais
Na tua canção
Há o sabor a terras distantes
E os suspiros de incansáveis amantes
Que já viveram demais
Portugal
E lá vem o Afonsinho
Muito bem preparadinho
Para vir bater na mãe
Mais o pobre Manuelinho
Muito bem arranjadinho
Para ver o que o espanhol tem
Do outro lado vem a corte
Que foi tentar a sorte
Para onde podia sambar
Atrás vem o gama
Mais o espanhol e o inglês da trama
Que não me consigo lembrar
Do outro lado está a padeira
Com a pá derradeira
Da vitória gloriosa
Depois vem o Luís
Que perdeu o olho por um triz
Nalguma guerra caprichosa
Está também o pessoa
O Alegre e, na Madragoa
Mais uns quantos dois ou três
Vem Sancho e o filho
Vem Pedro a seguir o trilho
Da busca por Inês
Com os primos pela mão
Vem Lúcia, buscando em vão
Paz para esta terra
Atrás vem o povo a marchar
Com vontade de lutar
Na próxima Grande Guerra
Antero e João Leitão
Escrevem nas pedras do chão
A sina deste país
Enquanto mestre Gil sem se calar
Continua a criar
Mais teatros de raiz
O marquês traz a saudade
De criar com liberdade
Uma cidade diferente
Enquanto Cabral festeja alegremente
Sentado em pau-brasil
Mais uma descoberta entre mil
Ali chora uma menina
Ainda muito pequenina
Vitima da peste negra
Os outros reis e rainhas
Que antes também ela tinha
Vêm mais à esquerda
Vem Salazar a ordenar
Mais prisões para onde mandar
Este povo falador
Vem Amália a cantar
O segredo de amar
E o seu grande dissabo
Vem uma mãe chorosa
Com medo que quem saia vitoriosa
Seja a outra tropa
Aquele homem traz o tratado
Assinado pelo Estado
Sobre a união da Europa
Vem o empresário falido
O filho perdido
E o agricultor roubado
Vem o politico corrupto
O nobre exilado
E o povo abandonado
E vem a conclusão
Que desta desilusão
Há em todo o lado
Já não há mais para investir
Nem ouro para descobrir
Mas ainda nada está acabado
A Ti
A sala vazia
Do teu olhar
O suspiro só
Do despertar
A noite fria,
A escuridão
O som que fazia
A solidão
O som do vento
O horizonte
O cume alto
Daquele monte
O frio do inverno
Na tua mão
E o calor do pico
Do Verão
O dourado seco
Da seara
O verde fresco
Da floresta clara
O azul abandonado
Do céu cinzento
O mar salgado
E violento
As lágrimas, o riso
E a cobrança
As cores sujas
De uma lembrança
A falta que sinto
De ti
E a esperança
De te ver aqui
Pai Nosso
“Pai Nosso que estais no céu”
Nunca foi essa minha prece
Oração que alivia, que acalma
Só pertence a quem a tece
E eu escrevo como quem reza
Terço a terço cadernos e blocos
Pai Nosso, Nossa Chama
Sabedoria Plena e Soberana
És Tu a luz que nos guia e conforta
És Tu a cruz que nos ensina e transporta
Para o bem
Pai Nosso, Guida da alma
Permiti que nunca perca a calma
O rumo, o sentido, a direcção
Permiti que nunca seja indiferente
A um pedido do coração
Com tanta igreja à escolha e não tenho nenhuma
Deus é único e a sua fé é só uma
Crer nele é crer no amor
Deus é Luz e não medo e terror
Permiti que nunca esqueça essa verdade
Que nunca perca essa liberdade
De escolher

Medo
Medo de não conseguir
Medo de seguir em frente
Medo de sentir
Aquilo que se sente
Medo de querer
Medo de não ser ninguém
Medo de parecer
Que se é alguém
Medo de existir
De estar aqui ou ali
Medo do risco
De ficar sem ti
Medo do mundo
Medo de sonhar
E um medo profundo
De acordar
Medo do que se é
E de o deixar de ser
Medo de ter fé
E medo de não ter
Medo de sofrer
Medo que o medo cause sofrimento
Medo de viver
Um sentimento
Medo de ter saída
Medo de ter sorte
Se ninguém escolhe a vida
Porque se há-de escolher a morte?
Seus poemas são muito bons! ☺
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Obrigada 🙂
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