
Algures, num dia qualquer, alguém – por uma qualquer razão corajosa e milagrosa – reconheceu finalmente o seu dragão. E essa pessoa decidiu confiar no que sentia e saber o que sabia, e ousou imaginar uma ordem invisível na qual podia ser livre. Recusou conter-se por mais tempo. Decidiu pôr o seu interior e simplesmente Deixar Arder. Levantou a mão e disse: «Estes rótulos não me parecem verdadeiros. Não me quero espremer dentro de nenhum destes copos. Para mim, não é exactamente assim. Não tenho a certeza do que é, ainda, mas não é assim.»
Alguém ouviu a primeira pessoa corajosa falar e sentiu uma esperança elétrica a percorrer as suas veias. Pensou: Esperem. E se eu não estiver sozinho? E se eu não estiver avariado? E se o sistema de copos estiver avariado? Sentiu a sua mão erguer-se e a voz elevar-se com um: «Eu também!» Depois, a mão de outra pessoa levantou-se lentamente e depois outra e outra, até haver um mar de mãos, algumas a tremer, outras formando punhos – uma reação em cadeia de verdade, esperança e liberdade.
Não acho que a homossexualidade seja contagiosa. Mas tenho a certeza de que a liberdade é.
Em nome da liberdade, acrescentámos mais copos. Dissemos: «Está bem, estou a ouvir-te. Aqueles outros copos não encaixam para ti. Ora aqui está um copo bissexual para ti! E para ti, que tal um copo pansexual?» Continuámos a acrescentar copos etiquetados para cada letra LGBTQ até parecer que acabaríamos por usar todo o alfabeto. Isto era melhor, mas ainda não exatamente correto, porque alguns copos ainda tinham menos direitos e maiores encargos. E algumas pessoas, como eu, ainda não conseguiram encontrar um copo no qual se encaixassem.
O meu palpite é que as pessoas sempre tiveram uns 50 tons de homossexualidade. Pergunto cá para mim se, em vez de adicionar-mos mais copos, não deveríamos deixar de tentar conter as pessoas dentro deles. Talvez acabemos por nos livrar do sistema de copos por completo. A fé, a sexualidade e o género são fluídos. Sem copos – tudo mar.
[DOYLE, 2020, p. 196 e 197]
Ela olha para mim, os olhos arregalam-se-lhe e ela sorri. Mudo de ideias. Não sei o que quis dizer, mas estou feliz por o ter dito. Decido que o paraíso é dizer qualquer coisa que faça esta mulher sorrir assim.
[DOYLE, 2020, p. 46]
Talvez sejamos todos fogo envolto em pele, tentando parecer calmos.
[DOYLE, 2020, p. 54]
Glennon tinha aquilo que muitos considerariam a vida perfeita: um casamento bem sucedido apesar dos seus altos e baixos, três filhos, uma fé forte e uma carreira de sucesso como escritora. Ela própria achava que tinha a vida perfeita. Mas algo não estava bem. Então um dia, num evento, uma mulher que Glennon nunca tinha visto entra na sala. E ela apaixona-se imediatamente por ela.
Indomável é a história verídica de Glennon Doyle, a autora do livro. Uma mulher casada, mãe de três filhos, religiosa e escritora que de um momento para o outro se apaixona por outra mulher e decide abandonar a vida que sempre conheceu por esse amor.
É uma leitura muito fácil e que, de certa forma, nos faz questionar muitas coisas. Glennon não se limita a falar sobre sexualidade. Neste livro ela dirige-se às mulheres e incentiva-as a terem coragem de procurar o que realmente querem, de descobrirem quem realmente são, por detrás de todos os padrões de género e expectativas que nos são impostas desde a primeira infância. É, acima de tudo, um livro sobre coragem e autodescoberta. Um livro sobre como todos nós somos um mar, fluido.
A leitura é extremamente fácil e rápida. Admito que a determinada altura dei comigo um pouco cansada de ler sobre os filhos e a religião da autora, que são temas muito falados ao longo da obra e não me dizem muito. Mas é uma leitura agradável e uma história de amor e coragem muito bonita.
Livro recomendado. 3,5*