“Mas eles insistiram e a família reuniu-se em círculo à volta do seu leito. Teve de padecer para fazer figura de amável diante de todas aquelas pessoas cheias de saúde que lhe haviam invadido o aposento. As suas vozes fortes, os seus olhares claros feriam-no lá bem no cerne da decrepitude e da tristeza. Até mesmo Martine já não tinha graça aos seus olhos. Enfim, eles foram-se embora com a sua moedora alegria de viver.”
“Ela tirou tudo de cima da mesa e foi buscar as cartas. Sentados face a face, desdobraram cada qual a sua paciência. Não tinham necessidade de falar um com o outro para saborearem o prazer de estar juntos.”
Henry Troyat, nascido com o nome Levon Aslani Thorosian ou Lev Aslanovich Tarasov, foi um escritor, ensaísta, novelista e historiador francês de ascendência arménia nascido a 1 de Novembro de 1911 em Moscovo na Rússia
Em O Bater Solitário do Coração conhecemos Igor Dimitrievich, um velho exilado russo de 93 anos a viver em França em 1968. Viúvo, vive emaranhado na solidão e nas recordações, no centro de um mundo que já não reconhece como seu. À sua volta estão os filhos, as noras e os netos, todos com as suas próprias vidas e dramas, histórias de que ele só vagamente faz parte. Acompanhado por uma governanta/cuidadora de quem não gosta muito, continua a recusar-se a falar francês, limitando-se ao russo, apesar dos muitos anos que passaram desde a sua chegada a França.
Esta é uma obra extremamente realista sobre a solidão e o exílio, sem deixar no entanto de ser também poética. Troyat traz-nos um retrato lúcido sobre a natureza humana e as vidas que levamos, num livro curto, de leitura fácil, que nos deixa a pensar que, afinal, existem várias formas de exílio. Igor é uma personagem que aos poucos nos cativa, que desperta a compaixão dos leitores, que temos vontade de ajudar.
A realidade, as dificuldades de um exilado russo em França foram algo que nunca me tinha passado pela cabeça. Esta obra leva-as a um nível de realidade que chega a ser desconfortável para os leitores, o que só prova que o livro é bom. Sentimos a solidão de Igor, conseguimos palpar as saudades que ele tem da sua terra, dos seus amigos de infância, dos seus pais, da sua mulher…
É uma obra triste, pesada, mas bela e necessária.
Livro recomendado!