Há por aí umas más línguas que dizem que já ninguém lê poesia. Pois enganam-se. Alguns leitores mais estranhos, como eu, ainda pegam neste género literário tão dado ao esquecimento. Eu leio poesia como quem come chocolates, são uns atrás dos outros, sem olhar a gostos ou ingredientes.
Este livro foi-me apresentado por uma muito sábia professora de literatura portuguesa, tão devoradora de poesia e livros como eu. A determinada altura cheguei ao ponto de saber vários dos poemas deste senhor de cor, de tanto que os lia. Tudo bem que é romantismo, não é para todos os gostos. Mas vale sempre a pena experimentar.
Destino
Quem disse à estrela o caminho
Que ela há-de seguir no céu?
A fabricar o seu ninho
Como é que a ave aprendeu?
Quem diz à planta – “Floresce!” –
E ao mudo verme que tece
Sua mortalha de seda
Os fios quem lhos enreda?
Ensinou alguém à abelha
Que no prado anda a zumbir
Se à flor branca ou à vermelha
O seu mel há-de ir pedir?
Que eras tu meu ser, querida,
Teus olhos a minha vida,
Teu amor todo o meu bem…
Ai! não mo disse ninguém.
Como a abelha corre ao prado,
Como no céu gira a estrela,
Como a todo o ente o seu fado
Por instinto se revela,
Eu no teu seio divino
Vim cumprir o meu destino…
Vim, que em ti só sei viver,
Só por ti posso morrer.
Almeida Garrett