Carmilla
Sheridan Le Fanu

Joseph Thomas Sheridan Le Fanu nasceu em Dublin a 28 de agosto de 1814 e faleceu na mesma cidade a 7 de fevereiro de 1873. Foi escritor e editor e um dos grandes precursores da literatura gótica. Muitos acham que Drácula, de Bram Stoker, é a mais antiga história de vampiros a que temos acesso hoje em dia. Mas a verdade é que essa história é Carmilla, que teve inclusive uma forte influência na criação de Drácula. Sheridan Le Fanu era um autor do séc. XIX com tudo o que isso engloba. As histórias de vampiros tinham um forte lugar na cultura popular, a população acreditava muitas vezes a sério nestas criaturas da noite, temia-as e culpava-as por certas maleitas da altura. Sheridan Le Fanu era, ainda para mais, um autor da sua época, com as suas crenças e os seus preconceitos. Era aquilo a que hoje chamariamos um machista. Portanto, esta história é um reflexo de tudo isso. Carmilla é uma vampira lésbica, uma condessa morta à séculos que se aproveita de jovens donzelas indefesas, assediando-as e sugando-lhes o sangue até à morte. Porque para o autor, o reflexo do maior mal que ameaçava a humanidade era, obviamente, uma mulher lésbica. Preconceitos à parte, temos de reconhecer o mérito desta história. A obra está imensamente bem escrita, é simples mas interessante e apaixonante. Por vezes beira o erotismo, outras beira o terror. É uma história com pés e cabeça, com personagens de que gostamos apesar de toda a sua simplicidade. E é uma obra que influenciou todo um género literário, e isso é muito. Recomendado. Um leitura muito boa. 5*
O meu monstro e eu
Nadiya Hussain

O menino desta história tem um monstro. Um monstro grande e terrível, bem maior que ele, que não o deixa em paz. Ele já pediu ao pai e à mãe e ao irmão para o afugentarem, mas eles não o conseguem ver. Até que um dia… ele percebe que o pode mandar embora! Um livro bem construído, com uma boa história e belíssimas ilustrações, que é uma ótima forma de falar com as crianças sobre problemas e preocupações. Imensamente recomendado! 5*
João e mais oito
Maurice Sendak

João era um menino que gostava de viver em sossego. Mas de repente começam a chegar visitas: um cão, um rato, um gato, um macaco… e lá se foi o sossego! Conseguirá João voltar a ter a sua paz se… contar? Um livro em verso, inusitado, instrutivo e muito divertido, com boas ilustrações e que vale muito a pena. Maurice Sendak nunca desilude! Recomendado! 5*
És Importante
Christian Robinson

És importante, de Christian Robinson, é um livro infantil que não tem propriamente uma história e ao mesmo tempo tem duas. Ele é um livro concebido para dizer ao leitor que o leitor é importante, em qualquer altura e circunstância. E fá-lo através das palavras, brevemente e de forma poética. E também através das imagens, que acrescentam uma dimensão ainda maior às palavras. Fiquei honestamente tocada com este livro. É bonito, é poético, é estéticamente lindíssimo e… é importante! Porque é importante que todos os leitores, pequenos ou grandes, se lembrem sempre que são importantes. Recomendado! 5*
Pokko e o tambor
Matthew Forsythe

Pokko é uma pequena Rã, que vive com os pais num cogumelo. Um dia os pais de Pokko cometem um terrível erro: oferecem-lhe um tambor. E Pokko toca, e toca, e toca… toca tanto que o pai acaba por recomendar-lhe que vá tocar fora de casa. Pokko vai e quando volta traz consigo grandes surpresas… Um livro divertido, engraçado e muitissimo bem ilustrado. Promete pôr os pequenos – e os grandes – leitores a sorrir. Recomendado!
Dona Rosinha a solteira
Federico García Lorca

Dona Rosinha a solteira é uma peça de teatro que eu já conhecia anteriormente, uma vez que o grupo de teatrou de que fiz parte a levou ao palco durante bastante tempo. Lê-la foi, portanto, mais um recordar da história do que propriamente novidade. É uma obra que me traz muitas boas recordações e pela qual tenho um apreço especial. Dona Rosinha a solteira é uma história simples, com uma premissa que seria bastante menos séria no dia de hoje: Rosinha, que espera durante décadas pelo seu noivo, acaba solteirona, enquanto ele se casa lá longe com outra mulher e não lhe diz nada. É uma história “de outros tempos” sobre uma mulher apaixonada que acaba por ficr sem nada nem ninguém que lhe valha por ter ido no galanteio do homem errado. Apesar da premissa simples, é uma história bastante triste, sobre desilusões de amor, sobre a passagem do tempo e a vida que não é vivida. Está muito bem escrita, lê-se em menos de um sopro e é belíssima. Muito recomendado. 4*
O que procuras está na biblioteca
Michiko Aoyama

Em O que procuras está na biblioteca conhecemos a biblioteca da senhora Sayuri Komachi e da jovem Nozomi. Vemos diversas personagens passar por lá e a forma como a biblioteca e a senhora Sayuri mudam as suas vidas. Não tinha grandes expectativas sobre este livro mas a verdade é que adorei. É um livro que se lê em menos de nada, composto por diferentes histórias de diferentes personagens, o que torna a leitura ainda mais fluente. A biblioteca para verdadeiramente inspiradora e aconchegante, um lugar onde todos gostaríamos de estar e as personagens são pessoas que gostaríamos de conhecer. Todas as personagens que passam pela biblioteca tem algum problema para resolver, estão de alguma forma perdidas na vida. O que eu não esperava é que eles tivessem perdidas pela mesma razão: o seu dom, a sua vocação, o seu trabalho. Não há aqui grandes problemas amorosos ou dramas violentos. Os leitores desta biblioteca fantástica são pessoas que estão descontentes com o seu emprego; que ainda não conseguiram encontrar a sua vocação ou realizar os seus sonhos; que a determinado momento perderam o seu rumo profissional e estão novamente em busca dele. Não esperava esta vertente do livro. Mas a verdade é que adorei. Encantou-me, exactamente por não ser mais do mesmo, por falar de um tema que tem uma importância forte na minha vida e na minha personalidade e por, ainda para mais, se passar numa biblioteca! Livro preferido! 5*
Como água para chocolate
Laura Esquivel

Em Como água para chocolate conhecemos Tita, a mais nova de três irmãs e que portanto, segundo a tradição familiar que a mãe insiste em preservar, está proibida de se casar para cuidar da sua mãe na velhice. Acontece que Tita apaixona-se por Pedro e não só é a primeira das três a apaixonar-se, como é a única. A mãe, claro, proíbe essa casamento e como para Pedro a única hipótese de ficar perto de Tita é casar com a irmã mais velha, Rosaura, o rapaz acaba por aceitar tornar-se cunhado da mulher que ama. Seguem-se décadas de paixões e segredos, de voltas, reviravoltas e muitas… receitas. Como água para chocolate é um livro que apela aos cinco sentidos. Tita cresce na cozinha da casa e acaba por tornar-se ela própria uma cozinheira muito especial. Ao longo desta deliciosa leitura quase conseguimos sentir os cheiros e os sabores destas comidas, quem sabe até os seus efeitos… É um livro fantástico que se lê em menos de nada. Admito que o fim dos amores de Tita não é o que eu esperava. A determinado momento da história dei por mim a torcer por um final que não aconteceu, mas até não era mau. E depois, de repente, nas últimas frases, o final que não era mau passou a terrível. Excelente, mas terrível. Certamente um final que não vou esquecer tão depressa. Muito recomendado. Livro preferido. 5*
A Pérola
John Steinbeck

Kino é um homem simples e pobre, um pescador de pérolas que vive numa cabana com a sua esposa Juana e o filho bebé Coyotito. Um dia Coyotito é mordido por um escorpião e num ato de desespero, para poder pagar ao médico, Kino parte em busca de pérolas. É então que se dá o milagre e Kino encontra a maior pérola já vista, a Pérola do Mundo. Mas quando começa a tentar vendê-la as coisas começam a correr mal, muito mal… Esta história é baseada num conto popular mexicano. É, portanto, muito diferente dos livros anteriores que eu li do autor. Lê-se muito bem, é uma história forte, bonita e comovente mas que em nada se compara às outras. Apesar do seu significado, da sua lição e até da sua própria história enquanto narrativa popular, foi uma história que não me conquistou totalmente, pois as minhas expectativas estavam muito elevadas. Recomendado. 3*
O Acontecimento
Annie Ernaux

Annie Ernaux nasceu em Lillebonne a 1 de setembro de 1940. Foi a vencedora do Prémio Nobel da Literatura em 2022. Em O Acontecimento conhecemos uma jovem estudante de 23 anos que descobre que está grávida. No tempo da acção, em 1963, a gravidez de uma rapariga solteira era algo muito mal visto. Ela sabe, desde o primeiro momento, que a sua única solução é um aborto: não quer nem está preparada para ser mãe. No entanto o aborto é também ilegal e muito, muito perigoso. Acompanhamos então a jornada da personagem em busca de uma forma de abortar… Annie Ernaux foi a vencedora do nobel “pela coragem e acuidade clínica com que descortina as raízes, os estranhamentos e os constrangimentos coletivos da memória pessoal”. Neste momento, após ter lido esta obra, parece-me que “coragem e acuidade clinica” são de facto as melhores expressões para a descreverem. Que livro! É uma obra pequena, de apenas 87 páginas. A escrita é deliciosa, forte e sedutora, vagueia entre a situação da personagem-narrador que nos surge em forma de memória e alguns outros pensamentos que a personagem vai tecendo. É um livro fácil de ler, mas não é um livro fácil de digerir. Eu terminei a leitura verdadeiramente agoniada com as descrições da personagem, com a sua situação, com a sociedade. É um livro que nos deixa em alvoroço e nos dá a volta ao estômago. Possivelmente uma das melhores leituras do ano. Muito recomendado. 5*
As Canções de António Botto

António Tomás Botto foi um poeta, contista e dramaturgo português que nasceu a 17 de agosto de 1897 em Concavada e faleceu a 16 de março de 1959 no Rio de Janeiro. Da mesma geração de poetas como Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro, com quem travou conhecimento, António Botto é ainda assim bastante menos conhecido do que eles. Foi um dos precursores do verso livre e é considerado um poeta maldito da literatura portuguesa. A sua poesia fala, de forma bastante clara, sobre o amor homossexual, o que causou um enorme escândalo na sociedade da época. Ostracizado e infetado com sifilis o poeta acabaria por se exilar no Brasil, onde morreu depois, brutalmente atropelado. Quem me conhece sabe que sou uma apaixonada por poesia, apesar de não falar muito frequentemente dela aqui no blog. António Botto é, sem sombra de dúvida, um dos meus poetas preferidos. A sua poesia é bastante irregular em termos de métrica e rima e portanto, diria eu, não é da poesia mais fácil de ler para quem não está habituado ao género. Ainda assim eu acho que vale muito a pena tentar. Os poemas de Botto são um misto de amor, erotismo, dor e coragem. Por vezes em alguns poemas notamos uma forte ironia, uma revolta mesmo, contra alguns aspetos e personagens da sua sociedade. Não são os meus preferidos, mas admito que admiro a coragem que teve para os escrever. Acima de tudo esta obra, As Canções de António Botto, está repleta de uma honestidade atroz. O autor expõe-se de uma maneira que vemos muito poucas vezes. Muito recomendado. Livro preferido. 5*