
“Quem é que abraça o meu corpo
Na penumbra do meu leito?
Quem é que beija o meu rosto,
Quem é que morde o meu peito?
Quem é que fala da morte
Docemente ao meu ouvido?
– És tu, senhor dos meus olhos,
E sempre no meu sentido.”
“Chora a amante esquecida,
Chora quem vai barra fora;
– Quem não chorou nesta vida
Se o próprio mar também chora?
Sim; tudo acaba num ai,
Num silêncio, num olhar,
Ou numa lágrima triste!
– Nem já sei se te beijei
Nem me lembro se me viste…
É isto, apenas. O mais,
É mentira e fantasia…
– Se a vida não fosse choro,
O que é que a vida seria?”

António Tomás Botto foi um poeta, contista e dramaturgo português que nasceu a 17 de agosto de 1897 em Concavada e faleceu a 16 de março de 1959 no Rio de Janeiro.
Da mesma geração de poetas como Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro, com quem travou conhecimento, António Botto é ainda assim bastante menos conhecido do que eles. Foi um dos precursores do verso livre e é considerado um poeta maldito da literatura portuguesa. A sua poesia fala, de forma bastante clara, sobre o amor homossexual, o que causou um enorme escândalo na sociedade da época. Ostracizado e infetado com sifilis o poeta acabaria por se exilar no Brasil, onde morreu depois, brutalmente atropelado.
Quem me conhece sabe que sou uma apaixonada por poesia, apesar de não falar muito frequentemente dela aqui no blog. António Botto é, sem sombra de dúvida, um dos meus poetas preferidos. A sua poesia é bastante irregular em termos de métrica e rima e portanto, diria eu, não é da poesia mais fácil de ler para quem não está habituado ao género. Ainda assim eu acho que vale muito a pena tentar.
Os poemas de Botto são um misto de amor, erotismo, dor e coragem. Por vezes em alguns poemas notamos uma forte ironia, uma revolta mesmo, contra alguns aspetos e personagens da sua sociedade. Não são os meus preferidos, mas admito que admiro a coragem que teve para os escrever.
Acima de tudo esta obra, As Canções de António Botto, está repleta de uma honestidade atroz. O autor expõe-se de uma maneira que vemos muito poucas vezes.
Muito recomendado. Livro preferido. 5*