Princípio de Karenina – Afonso Cruz

“Eu seria muito infeliz num mundo feliz. Ela seria feliz em qualquer mundo”

“O pão era amassado às quartas-feiras e quando era cozido o vento não soprava. À noite, as palavras saiam com uma solidão que não tinham durante o dia e os olhos das criadas da nossa aldeia fechavam-se debaixo dos seus patrões.”

“A realidade pode ser muito dura, mas os sonhos dão boas almofadas. O mundo pode ser de pedra, mas os sonhos são um colchão por cima dele e têm a teimosia e a ousadia de não desistir. Por mais que os afastemos, enxotemos como fazemos às moscas incómodas, os sonhos voltam sempre a assombrar-nos, a pousar-nos na cabeça, a picar-nos. Não é a dureza do mundo que vence, são estes insectos frágeis, sem ossos, sem corpo, a que chamamos sonhos, que acabam por fazer buracos no mundo, por o penetrar e vencer.”

Quem visita este meu cantinho literário de vez em quando já deve ter visto por aí quando eu digo que um dos meus livros preferidos é o Para Onde Vão os Guarda-Chuvas, de Afonso Cruz. Para mim esse é um livro realmente fantástico, daqueles que não saem de maneira nenhuma da minha estante e que, de quando em vez, eu releio.

Por isso quando peguei neste novo livro eu esperava ler algo realmente bom, mas não esperava que fosse melhor do que o Para Onde Vão os Guarda-Chuvas. E foi realmente o que tive.

Em o Princípio de Karenina conhecemos um pai que conta à filha a sua história e a da sua família. Uma história cheia de distâncias, saudades e segredos. Um livro cheio de sabores exóticos e terras distantes, tão longe como a Conchichina.

Esta é, acima de tudo, uma história humilde. Como diz algures no livro sobre uma das personagens “não tinha o desejo de mudar o mundo, queria apenas fazer parte dele”. É assim que esta história é. Algo que veio para fazer parte de nós, que fica a pairar no fim, que nos vai ficar na memória por muito tempo. Mas, que ainda assim, não chega a mudar o mundo.

No fundo acho que esta história é um toque de magia. A escrita tem poesia em cada frase, dá vontade de reler tudo outra vez e outra e outra… A história não é demasiado pesada que nos deixe de coração apertado e estômago às voltas, com uma crise existencial. Mas tem peso suficiente para nos pôr a pensar, mais ou menos seriamente, sobre o que fazemos das nossas próprias vidas. Sobre o amor e a distância. Sobre os nossos medos e o que eles nos impedem de fazer.

Esta é uma história simultâneamente doce e amarga, que nos agarra do inicio ao fim e que temos vontade de reler assim que terminamos. Um livro incrível, com uma escrita ainda mais incrível, sem grandes pretensões. Simples, complexa, inesquecível e muito, muito poética.

Nota ainda para a edição que é, tal como a história em si, despretensiosa e com um toque especial. Simples mas de excelente qualidade e que facilita a leitura.

Livro mesmo muito recomendado!!

Livro na Wook

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